Em 1963, um ano antes da Revolução
Militar de 64, eu ingressava no Jornal Ultima Hora, edição Nordeste, cuja sede ficava na Rua Visconde de Goiana, na Boa Vista. Para mim, uma escola de jornalismo de alto
nível, Independente de sua linha política, já que apoiava Miguel
Arraes, tido como defensor do regime comunista.
Minha coluna de estréia foi publicada no domingo, 11 de agosto de 10963.
O diretor era Mucio Borges da Fonseca. O editor geral: Ronildo Maia Leite. Na chefia do departamento fotografico, Clodomir Bezerra. Assumi a editoria de rádio e
televisão. Escrevia uma coluna que não ultrapassava um quarto de
pagina. Diariamente. Dava noticias,
fofocas e
entrevistas curtas com gente
que atuava nos meios de comunicação.
Tudo dentro do ritmo dinâmico
do jornal que primava por matérias polemicas, linguagem objetiva
e direta, evitando os clichês costumeiros dos demais periódicos. Recordo de um fato que não se passou comigo, mas que me impressionou
bastante. Um fotografo do jornal, cujo nome não me recordo, foi designado
para fazer a cobertura de uma procissão no centro da cidade. Recomendação
do editor:
- “Não quero fotos de andor, nem de
padre, nem de freira. Quero uma foto
expressiva para ilustrar matéria de primeira página. Se vire.”.
E o fotografo saiu da redação
com uma preocupação na cabeça. Durante
toda a procissão fez dezenas de fotos, mas em todas aparecia uma parte do andor, ou um padre ou uma
freira. Não sabia mais o que fazer para atender o pedido do editor. Já
retornando à redação, avistou uma
criancinha fantasiada de anjo, com as mãos postas como se estivesse
rezando. Tacou o dedo no clique da
máquina. Foi essa a expressiva foto ;
primeira pagina do jornal.
Essas provocações eram comuns na
redação. O obvio não era o ideal. As inovações eram bem
aproveitadas. Uma linha de matéria redacional poderia dar uma manchete de
oito colunas, como aconteceu comigo.
Certa feita, escrevi na coluna:
- “FPF vai proibir o vídeo-tape do
futebol”.
Foram só
essas cinco palavras, sem maiores comentários. O fato me foi confidenciado por
um diretor de Televisão, porque na época o futebol era gravado para exibição na
noite do mesmo dia. Quando abri o jornal no dia seguinte, lá estava a frase em
letras garrafais de canto a canto da pagina, encabeçando a minha coluna. A repercussão foi grande, mas graças a Deus
ninguém contestou a nota. Se não, eu
estaria sumariamente demitido. Eram colunistas do jornal: Marcel (Sociedade); M. Barbosa (Cidade Nua); Lula Carlos (Bola na Rede); Celso Marconi (Cinema); Wilton de Souza (Artes plásticas), Carlos Garcia (Economia), Stelio Gonçalves (Luzes da Cidade), entre outros.
Sem querer ser redundante, fiquei na Ultima Hora até a sua ultima hora, 10 horas da manhã do dia 1 de
abril de 64. Entreguei minha matéria na redação e me preparava para sair, Ronildo
Maia Leite fez o pedido:
- “Quando você chegar no centro da
cidade, observe se há algum movimento do Exercito e liga prá gente.”
Jovem, sem muito conhecimento dos
rumos da política, não soube avaliar o dramático significado daquele pedido. Naquela mesma
manhã não cheguei a dobrar a
Visconde de Goiana em direção à Avenida Manoel Borba, andando porque não tinha carro. Os caminhões carregados de soldados do
Exercito seguiam em direção ao jornal
para empastelá-lo.
Segundo Ronildo Maia Leite: - “Ultima
Hora era um jornal que nada temia e pagou caro pela ousadia.”
Fim melancólico de uma verdadeira
escola de jornalismo, criada por Samuel Wayner, onde aprendi
muito convivendo com gente que realmente sabia fazer jornal.